Rodrygo tem 17 anos, cursa à noite o último semestre do ensino médio e precisa da carona do pai para ir aos treinos do Santos todos os dias. A voz ainda desafina, às vezes, entre uma frase e outra. Mas o futebol já é de gente grande. E isso por si só o obriga a encarar a vida de outra maneira.
Não dá para viver mais como um adolescente. Encontrar o que se ama fazer desde cedo e conseguir estabilidade financeira antes da maioridade também tem seu preço. No caso de Rodrygo foram 50 milhões de euros (aproximadamente R$ 217 milhões) pagos pelo Real Madrid por sua contração – ele se apresenta ao clube espanhol em junho de 2019, cinco meses depois de completar 18 anos.
O problema é que ganhar os holofotes do mundo da bola assim tão cedo exige também uma nova postura em relação à vida. Uma delas é a requisição dos jornalistas. Rodrygo tem uma fila de entrevistas para dar, com repórteres do mundo inteiro interessados em tirar alguma informação exclusiva e trazer em primeira mão uma novidade desse novo diamante do futebol brasileiro.
O mais novo Menino da Vila negociado com o futebol europeu conversou por cerca de 20 minutos com o Estado. O foco e a resignação são de quem já sabe muito bem o que quer: “No dia que o Brasil foi eliminado (da Copa do Mundo na Rússia), conversei com meu pai e falei: agora é treinar bastante porque em 2022 (no Mundial do Catar) a gente tem que estar lá”, disse.
O pai, Eric Goes, tem 34 anos e pendurou as chuteiras há alguns meses para poder se dedicar melhor à carreira do filho, que anda de vento em popa. Eric atuou como lateral-direito e rodou por diversos clubes do futebol brasileiro como Criciúma, Ceará, Guarani, Linense… Parou no Cuiabá. Rodrygo fala bastante do pai. Eles moram juntos em uma casa que conta ainda com a presença da mãe e da irmã de apenas cinco meses. Lembra um pouco a história de Neymar, mas é diferente.
Neymar é a principal referência de Rodrygo nos gramados. E falar sobre seu ídolo foi o único momento da conversa que o garoto se alongou um pouco mais. A nova revelação santista acha que a imprensa, de uma maneira geral, foi bastante injusta com o atual camisa 10 da seleção brasileira na Copa do Mundo da Rússia.
“Para um cara que estava três meses parado acho que ele até fez bastante. Só não vê quem não quer. Querem fazer polêmica, dizer que ele não jogou. Acho que estão falando muita besteira. O rendimento dele foi muito bom. Aqui no Brasil vocês puxam muito o saco dos gringos. Muita gente estava se jogando, simulando e ninguém falava nada. Mas quando é o Neymar querem criar toda essa polêmica”, reclamou.
Outra coisa que o Rodrygo não gosta muito é de ser comparado o tempo inteiro com Robinho e Neymar, os últimos grandes talentos vendidos a peso de ouro para o exterior. “É a pergunta que mais tenho que responder desde que me tornei profissional (em julho de 2017). Mas eu não quero ser o novo Neymar ou novo Robinho. Sou o Rodrygo”, afirmou.
TRÊS GERAÇÕES
Não querendo comparar, mas já comparando esses três jogadores, nota-se uma semelhança no primeiro ano em que de fato atuaram pelo Santos como profissionais. Em 2002, Robinho marcou dez gols em 30 jogos, média de 0,33 por partida. Neymar, em 2009, fez 14 gols em 49 partidas, média de 0,28. E Rodrygo, até agora em 2018, balançou as redes nove vezes em 30 duelos, média de 0,3.
Fora de campo, a primeira impressão é de que são completamente diferentes. Robinho era mais brincalhão, extrovertido, piadista. Neymar sempre foi mais marrento, preocupado com o visual, um corte de cabelo por jogo. E Rodrygo parece ser mais centrado, cuidadoso com o que fala, contido. As respostas do garoto durante toda a entrevista, em sua maioria, foram curtas e diretas. Sentado na cadeira, mexia e remexia no cadarço do tênis, tirava e colocava no pé do Nike novinho em folha – a multinacional esportiva patrocina o jogador desde que ele tem 11 anos. Enquanto isso, sem muita empolgação, falou sobre a expectativa em defender o Real Madrid, o clube mais poderoso do mundo. “A gente fica imaginando como vai ser, mas tem mais um ano de Santos. Tenho que estar 100% focado aqui. Espero as melhores coisas possíveis lá”, afirmou.
MADRI É LOGO ALI
Rodrygo nem o pai viajaram ainda para a Espanha. O contato direto com os dirigentes madrilenhos foi feito apenas pelo empresário Nick Arcuri. O jogador santista disse que troca de vez em quando mensagens com a comissão técnica do Real. “A relação é boa. Falam para pegar firme nos treinamentos para quando chegar lá ter um início bom. É mais ou menos isso.”
No Real, Rodrygo já não terá mais a companhia daquele que considera o melhor jogador do mundo: Cristiano Ronaldo. O atacante, no entanto, evitou lamentar e também traçar qualquer opinião sobre o acerto do craque português com a Juventus. “Cristiano é o melhor na minha opinião. Mas não dá para julgar se o que fez foi certo ou errado”, afirmou.
Certo apenas é que o atacante de 17 anos está feliz da vida em atuar no time europeu que sempre mais gostou de assistir. Ele também se vê com a cabeça no lugar e não demonstra muita preocupação com todo dinheiro envolvido na contratação. “Sou um cara bem tranquilo. Não tem necessidade de fazer um trabalho especial para isso. Não deixo subir para a cabeça essas coisas”, disse.
A estrada que aparece pela frente tem o Santos no Campeonato Brasileiro, na Libertadores e na Copa do Brasil, a seleção brasileira sub-20, os Jogos Olímpicos de Tóquio-2020 e depois, se tudo der certo, a Copa do Catar em 2022. “Uma das metas da minha carreira, já consegui, que é ser contratado por um grande clube da Europa. Agora é chegar na seleção principal e um dia ser o melhor do mundo”. Só isso.
Fonte: O Estado de S.Paulo