Do outro lado do planeta, o atacante Edigar Junio vivencia a pandemia de covid-19 de forma diferente de outros brasileiros. Ex-jogador do Bahia, ele mora em Yokohama, no Japão, onde defende o Yokohama Marinos há quase um ano e meio. “Quando começou a pandemia, aqui no Japão não estava tendo quarentena ainda. A gente saía na rua tranquilo, não tinha mudado nada”, relata o atleta de 29 anos.

“O número de mortos não foi tão grande em relação a outras nações, então acho que, por isso, o governo não teve medidas mais rígidas. Depois, quando foram aumentando os casos e eles viram que poderia piorar, aí sim tomaram outras atitudes”, completa Edigar.

Dono da população mais idosa do mundo, o Japão poderia ter sido um alvo fácil do novo coronavírus. No entanto, o país com 126 milhões de habitantes registrou 16.305 casos e 749 mortes, de acordo com a Universidade John Hopkins, dos Estados Unidos, que monitora o avanço da covid-19 em todos os países do mundo. Os número são muito inferiores aos da Itália, por exemplo, que soma 225.886 infectados e 32.007 mortos. Estudiosos apontam que a cultura do arquipélago oriental tem costumes que evitam a proliferação de doenças, como o cumprimento sem aperto de mãos, a retirada de sapatos e o uso de máscara a qualquer sinal de resfriado.

O primeiro caso do novo coronavírus foi registrado no Japão em 16 de janeiro, poucos dias depois da China, país onde o vírus foi originado, emitir um alerta sobre a doença. Porém, as autoridades só tomaram medidas mais efetivas para restringir a circulação da população 82 dias depois. “Só depois que paramos de treinar que aí ficou um pouco diferente”, conta Edigar, que fez a última atividade presencial junto com o restante do elenco em 4 de abril. “Foi um amistoso, contra o Júbilo Iwata, e eu inclusive fiz dois gols. Depois, a gente teve que treinar em casa”, pontua.

Três dias depois, em 7 de abril, o primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, declarou estado de emergência como forma de combater a aceleração do número de casos de covid-19 e o suspendeu em 14 de maio na maior parte do país, exceto em Tóquio, devido à queda acentuada nos registrados da doença nas últimas semanas. Na opinião de Edigar Junior, um fato foi mais efetivo para chamar a atenção da população, o adiamento dos Jogos Olímpicos de Tóquio, determinado em 24 de março.

“Acho que o adiamento da Olimpíada ligou um alerta na população e nas autoridades. Aí o povo viu que não se trata de um vírus qualquer, começou a se cuidar mais, ficar mais em casa, fechar estabelecimentos”,
observa Edigar.

Durante um mês, Edigar fez treinos físicos em casa. “Os nossos treinamentos sempre foram via chamada de vídeo. O preparador físico montava uma sala com todos os jogadores e aí a gente ia fazendo os treinos online. Cada um na sua casa”. Um motivo pra lá de especial fez com que Edigar não se incomodasse de passar tempo integral com a família. Primeiro filho do atacante, João Miguel nasceu durante a pandemia, há um mês e meio. “O bom disso é poder estar mais próximo e acompanhar meu filho de perto nesse momento que ele chegou”. Sem jogos e viagens, o papai pode vivenciar de verdade as primeiras emoções da vida do pequeno.

“Tô curtindo demais. Sempre foi um sonho que eu tive ser pai. Sempre gostei de criança e tenho duas sobrinhas que são o meu xodó, mas o meu filho é uma coisa diferente. É um sonho que eu sempre tive e tô aproveitando de tudo. Já troquei fralda, tomei mijada. Tô fazendo de tudo um pouco e aproveitando cada momento com ele”, diz, orgulhoso.

Adaptação

O Campeonato Japonês foi suspenso após a primeira rodada, disputada entre 21 e 23 de fevereiro, e não tem data definida para recomeçar, mas os jogadores do Yokohama Marinos voltaram a fazer atividades individuais no centro de treinamento do clube desde o último dia 7. “A gente está começando a voltar aos treinos aos poucos. Eles disponibilizaram campo e bola pra gente fazer treinos individuais, mas ainda não tem treino em grupo. A gente vai para o treino e tem que trazer a nossa roupa de volta, não tem vestiário”, detalha Edigar Junio. “A gente está começando a sair de casa para voltar aos treinos, porque o pensamento do clube e do país é que volte dia 1º de junho”, aponta o atleta.

Edigar não teme o retorno aos gramados. “A gente primeiro prioriza a saúde e, se as autoridades entenderem que já existe uma segurança pra gente poder exercer o nosso trabalho, eu irei sim. Não estou com medo de voltar a jogar. Acho que no momento certo vai voltar a acontecer e a gente tem que estar preparado pra jogar”, afirma o atacante, que está adaptado ao país oriental. Com o Yokohama Marinos, ele fez 16 jogos, marcou 11 gols e conquistou o título do Campeonato Japonês 2019. Edigar foi muito bem no primeiro semestre até se machucar em julho e ficar fora das quatro linhas o restante do ano.

“Quando eu vim pra cá, achei que seria mais difícil, mas é um país bem receptivo e a adaptação foi muito tranquila. Os moleques do elenco são muito gente boa, me receberam da melhor maneira e vêm me ajudando até hoje. Ainda não consigo desenrolar uma conversa, mas a gente aprende algumas coisas no dia a dia. Principalmente dentro de campo, a gente tem que saber instruir, perguntar, então é importante poder aprender pelo menos um pouco da língua deles para entrar no ritmo”, diz Edigar, que tem a companhia de outros três brasileiros no elenco do Yokohama Marinos, o zagueiro Thiago Martins e os também atacantes Erik e Marcos Júnior.

Contratado pelo Bahia em janeiro de 2016, Edigar Junio teve papel importante na campanha de acesso à Série A do Brasileiro e nas conquistas dos títulos da Copa do Nordeste (2017) e do Campeonato Baiano (2018). Após defender o tricolor em 142 partidas e marcar 44 gols, o atacante foi emprestado ao clube japonês em janeiro de 2019. No começo deste ano, teve o vínculo renovado por mais uma temporada.

Apesar de ter contrato com o Bahia até dezembro de 2021 e de continuar acompanhando os jogos do Esquadrão sempre que o fuso horário permite, Edigar sinaliza que pretende seguir no Japão.

“Pra ser sincero, não sei nem se a temporada vai terminar nesse ano de 2020, mas tô focado aqui, meu contrato vigente é com o Marinos. Eles têm a opção de compra, então vou fazer o meu trabalho. O que tiver de ser, vai ser, mas eu tô muito tranquilo, em paz, pois eu sei que independentemente de onde vá ser o meu futuro, vou estar muito feliz. Assim como eu fui muito feliz no Bahia, aqui no Marinos eu também sou”.

Fonte: Correio