— Doutor, há algum remédio para ficar mais alto?
A pergunta, recheada de esperança, era feita nas consultas que Artur e o pai, Raimundo Victor Sobrinho, passavam com especialistas. Questionavam com a expectativa de que fosse receitado um medicamento para favorecer o crescimento do garoto, que sonhava ficar mais alto e ser jogador de futebol.
A realidade apresentada pelos médicos, entretanto, ia contra a expectativa.
– Isso foi mais quando eu cheguei no Ceará, que eu era realmente muito pequeno. Meu pai sempre me levava (em médicos). Mas diziam que era normal. Meu pai e minha mãe eram baixos, então não tinha o que fazer – recordou Artur em conversa com o ge.
Artur marca gol para o Bragantino contra o Libertad-PAR — Foto: Ari Ferreira/Red Bull Bragantino
O garoto, que às vezes era o último a ser escolhido no futebol com amigos por ser baixinho, aceitou a realidade. Bom de bola, surpreendia quem o deixava por último pelo tamanho e se dedicava para alcançar o sonho de ser jogador de futebol.
A estatura ficou pequena perto do talento e do empenho do garoto. Hoje com 1,65 metro de altura, Artur é uma das principais armas do Red Bull Bragantino e o vice-artilheiro da Copa Sul-Americana, com sete gols.
Artur em treino do Bragantino — Foto: Ari Ferreira/Red Bull Bragantino
Neste sábado, o atacante mira subir ao lugar mais alto do pódio da competição internacional. Às 17h (de Brasília), disputa a final contra o Athletico, no estádio Centenário, em Montevidéu, no Uruguai.
– A ansiedade está a mil. Com certeza, para muitos aqui é o jogo mais importante da vida. Da minha também. Uma final de um torneio internacional. A gente fica, dia após dia, vendo que dia é hoje, que está se aproximando. Está chegando aos poucos. A ansiedade está batendo um pouco, dá aquele friozinho na barriga, mas isso é legal – comentou.
Melhor fase da carreira
Os números ajudam a provar o porquê Artur é uma das principais armas do Bragantino nesta temporada. Em 53 jogos disputados pelo Massa Bruta em 2021, são 17 gols, o que o deixa na vice-artilharia do time no ano. O atleta também é o maior garçom do Braga, com 15 assistências distribuídas.
Artur Bragantino x Emelec – Sul-Americana — Foto: Ari Ferreira/Red Bull Bragantino
O atacante, contratado pelo Bragantino em janeiro de 2020 junto ao Palmeiras por R$ 25 milhões, comemora o momento vivido. Ele destaca o trabalho e o amadurecimento para crescer neste ano.
– Vivo o melhor momento da minha carreira. Estou muito feliz pelo momento que passo aqui. É fruto de muito trabalho, que está sendo concretizado aqui, com a minha equipe, com o estafe, com todo mundo. Estou vivendo uma fase especial na minha vida, na minha carreira. Espero dar sequência até o fim da temporada e por muitos anos – disse.
Entre os 17 gols marcados neste ano, alguns se destacam por terem sido golaços. No Brasileirão, fez belos gols contra o São Paulo e o Flamengo, em que mandou a mandou no ângulo com chutes de fora da área. Na Sul-Americana, o atleta marcou um gol do meio-campo no segundo jogo das quartas de final contra o Rosário Central-ARG.
– É fruto de muito trabalho. A gente sempre trabalha esse tipo de finalização. Quando acaba o treino, eu finalizo bastante. Quando estamos vivendo uma fase muito boa, a gente pode chutar e vai estar lá na coruja (risos). Procuro arriscar bastante mesmo. A minha equipe, o professor, todo mundo me dá confiança para fazer isso. Então, eu arrisco mesmo e está dando muito certo – destacou Artur.
O atacante cresceu em um momento em que existia a dúvida de como o Bragantino ficaria após a saída de Claudinho para o Zenit-RUS, em agosto. O meio-campista, eleito o craque do Brasileirão de 2020, era até então a estrela da equipe. Artur assumiu o protagonismo e tem sido fundamental para o bom momento do time na Sul-Americana e no Brasileirão.
– Claudinho é um cara sensacional, tem uma história maravilhosa aqui no clube. O que ele fez no Campeonato Brasileiro foi uma coisa extraordinária, 18 gols. Viveu um momento esplendido no clube. Quando saiu, ficou aquela interrogação mesmo, do que seria. E a gente acabou trabalhando mais para suprir um pouco a ausência dele. Isso foi acontecendo naturalmente. Todos começaram a trabalhar mais ainda e, graças a Deus, as coisas foram acontecendo naturalmente. Fui fazendo os gols… Não só eu, mas meus companheiros de ataque, como Ytalo. Que bom que estamos entregando bons números, que bom que está dando certo – afirmou.
Artur e Claudinho no Bragantino — Foto: Ari Ferreira/Red Bull Bragantino
Campanha na Sul-Americana
O Bragantino voltou a disputar uma competição internacional após 25 anos. A última participação tinha sido na Copa Conmebol, em 1996. Neste retorno, agora sob a gestão da empresa austríaca Red Bull, o Massa Bruta viveu altos e baixos na competição.
Na primeira fase, estreou com vitória, mas duas derrotas na sequência deixaram a classificação ameaçada. O avanço ao mata-mata veio após uma vitória sobre o Tolima e uma derrota do Emelec para o Talleres-ARG. Nos mata-matas, eliminou Independiente Del Valle, Rosario Central e Libertad.
– A gente foi entendendo ao longo da competição. Estávamos jogando o Brasileiro e, de repente, virar a chave para um campeonato internacional. Então, no início a gente ficou meio cambaleando. Até que entendemos, pegamos o time da competição, vimos que é um jogo mais pegado. Sabemos como é o futebol sul-americano. É um jogo mais aguerrido, muita falta. Então, começamos entender isso. Depois que entendemos, amadurecemos, conseguimos desenvolver uma ótima competição. Soubemos virar essa chavinha e fomos super bem. Chegamos nesta final com méritos de todos – analisou Artur.
Ytalo, Artur e Praxedes – Rosario Central x Bragantino — Foto: Ari Ferreira/Red Bull Bragantino
A chegada do Massa Bruta à final é mais uma marca da rápida ascensão do time. Em 2019, o Bragantino estava na disputa do Brasileiro da Série B, quando foi campeão e conquistou o acesso à elite nacional. A evolução rápido surpreendeu positivamente não só quem está fora do clube, como quem está dentro.
– (A conquista do título) seria uma oportunidade de firmação do clube, para nós. Um jogo de 93, 95 minutos. Jogo muito difícil Sabemos da qualidade do Athletico, já foi campeão uma vez. Temos que estar preparados para, quem sabe, fechar este ano com este título – destacou.
De Campo Maior-PI ao Palmeiras
A conquista do título seria mais uma oportunidade de firmação do Bragantino e do atacante, natural de Fortaleza-CE. Artur Victor Guimarães nasceu em 15 de fevereiro de 1998, na capital cearense, mas com três, quatro anos a família se mudou para Campo Maior, no Piauí, onde o pai foi trabalhar.
Na cidade piauiense, Artur deu os primeiros passos no futebol com incentivo do pai, que enxergava no filho o talento para o esporte. A altura era uma questão, como falamos no começo da reportagem, mas Artur nunca viu isso como impedimento. Pelo contrário. Servia de motivação.
– Eu gostava muito de jogar bola, mas não tinha o sonho de ser um profissional. Até porque, sendo realista, lá do Piauí é muito difícil as oportunidades. Não imaginava que poderia chegar onde estou. Foi um processo de jogar na rua, escolinha – contou.
Em Campo Maior, a primeira escolinha foi da AABB, com o professor Zé Maria. Depois, foi para a escolinha do Carioca, treinador que Artur considera como um segundo pai pelos ensinamentos no futsal.
– Meu pai foi vendo que eu tinha qualidade, talento para isso e acabamos voltando para Fortaleza, onde tinha mais oportunidades, tinham times grandes, como Ceará e Fortaleza. Fui para o Ceará e fui muito bem. O professor Petróleo me acolhou bem e me colocava sempre para jogar em categorias maiores. Depois, tive a oportunidade de ir para o Palmeiras, onde comecei a encarar como profissional mesmo, com seriedade e descobrir que era isso que queria para minha vida. Quando vim para o Palmeiras, consegui chegar ao profissional – relembrou.
Passagem pelo Palmeiras
Artur disputava a Copa Rio, em Macaé-RJ, com a camisa do Ceará quando enfrentou o Palmeiras. O Vozão foi derrotado por 2 a 1, mas Artur chamou atenção do Alviverde e recebeu o convite para se mudar para São Paulo. Aceitou o convite e deu início à passagem pelo Palmeiras.
Artur, em destaque, com a equipe sub-17 do Palmeiras — Foto: Reprodução/Facebook
– No Ceará, sempre fui meia-atacante. Daí quando fui para o Palmeiras, cheguei ainda de meia, até que o Bruno Petri, um ex-treinador das categorias de base do Palmeiras, me colocou para ponta direita e já começava fazer muitos gols. No sub-17, fui artilheiro do Paulista disparado – disse Artur.
Artur foi se desenvolvendo no Palmeiras, teve passagens pela seleção de base e chegou ao profissional em 2016. No time principal do Alviverde, porém, não conseguiu ter sequência. Chegou a ser emprestado para Novorizontino e Londrina para ganhar experiência. Em 2018, viveu um ano difícil em que precisou fazer três cirurgias.
Artur em ação pelo Palmeiras — Foto: Fabio Menotti / Ag. Palmeiras / Divulgação
Em 2019, foi emprestado ao Bahia e foi um dos destaques do Tricolor de Aço no Brasileiro daquele ano, com dez gols marcados. A expectativa era, ao retornar do empréstimo, fosse mais aproveitado pelo Palmeiras. Mas a proposta do Bragantino mudou os planos.
– Fui para o Bahia, fui bem, fiquei nessa expectativa de atuar pelo Palmeiras. Mas daí apareceu a oportunidade do Bragantino, um projeto internacional, tinha meu sonho de Europa. Daí não pensei duas vezes. Achei que era o momento. Fiquei de mala e cuia – comentou.
– O Palmeiras, na minha formação, foi essencial. Saí com 15, 16 anos de Fortaleza direto para o Palmeiras. Me ensinaram muitas coisas. Sou sempre grato. Muitas pessoas pensam que tenho mágoa por não ter tido sequência de jogos, mas pelo contrário. Tenho uma gratidão enorme. Torço demais pelo Palmeiras. Muita gratidão. Sempre vou levar no peito – acrescentou.
Bragantino, Seleção e sonho de Europa
Artur foi contratado pelo Bragantino em janeiro de 2020 por R$ 25 milhões. À época, era a contratação mais cara da história do clube (Praxedes, contratado por R$ 36,9 milhões neste ano, passou a marca). O projeto da Red Bull, que tem equipes em outros países, como Alemanha e Estados Unidos, atraiu o jogador.
No primeiro campeonato que disputou com o Massa Bruta, foi eleito do Craque do Paulistão. Porém, no Brasileirão de 2020, caiu de rendimento e não conseguiu corresponder às expectativas. O atleta reconhece que viveu uma má fase no nacional e destaca ter amadurecido e trabalhado bastante para encontrar o melhor momento nesta temporada.
A boa fase rendeu ao atleta uma convocação para seleção brasileira.
– Foi a realização de um sonho muito grande. Ainda é um sonho. Ser convocado para a seleção profissional. É um sonho não só meu, mas da minha família também. Pude dividir com eles. Foi extraordinário. Estar convivendo com atletas de alto nível, profissionais sem palavras. Foi uma experiência maravilhosa. Trabalhar para viver isso de novo – disse.
Esse bom momento também atraia olhares da Europa. Artur não esconde o desejo de atuar fora do país, mas garante que o foco está no Bragantino.
– Já vi algumas matérias sobre (interesse de clubes europeus), mas minha cabeça está totalmente focada aqui. Ainda mais com o dia 20 se aproximando. Não tem como pensar sobre isso. Deixo nas mãos de Deus. Quem sabe, isso possa acontecer mais para frente. Mas, agora, o foco total aqui – comentou.
– Estou pensando no dia 20 ser campeão. Meu pensamento total é aqui. Mas não fujo do sonho de jogar na Europa. Gostaria de exercer a minha profissão na Europa. Desde criança, sempre sonhei isso. Falar em data é difícil. Deixo nas mãos de Deus – acrescentou.
Fonte: Ge.com