O futebol é um esporte eclético, com dogmas próprios. Tornar-se um jogador de alto nível é uma tarefa hercúlea mesmo para quem atende a todos os requisitos básicos. Se falta algo… Bom, é justamente aí que surgem as grandes jornadas. E não é necessário ter mais de 1,68 m para entrar nessa história.
Artur, atacante do Red Bull Bragantino, é prova disso. Desde muito cedo em sua vida, o camisa 7 do time de Bragança Paulista escutou que era “muito baixinho”. Por vezes, em ambientes novos, foi quem sobrou na hora de dividir os times. Em campo, Artur sempre driblou críticos com a mesma facilidade com que passava pelos marcadores.
Quando cheguei no Uniclinic, tinha 12 anos. Falaram ‘ah, ele é muito baixinho, será que vale a pena apostar nele?’. Ou então iam separar time e eu sobrava: ‘muito baixinho’. Mas eu começava a jogar e aí todo mundo queria. Sempre fui baixinho, mas sempre muito forte: quem trombava, batia e caía. Saí ganhando nisso. Meu sonho era maior e não tinha tamanho que me impedisse”.
Quis o destino que Artur fosse parar justamente no clube da empresa que tem por slogan “dar asas”. O baixinho que se acostumou a voar por cima das dificuldades nunca esteve tão em casa.
Recado dado
Quando o Red Bull Bragantino tirou do bolso R$ 25 milhões para ter Artur, um recado claro foi dado ao mercado: chegou. Após o acesso para a Série A do Brasileirão, o clube fazia sua primeira grande contratação, a mais cara da história do clube.
Naquela época, Artur era um dos alvos mais cobiçados do Brasil. O Palmeiras tinha um elenco estrelado e pouco espaço para alguém jogava na mesma posição do então maior ídolo do clube, Dudu. E o atacante vinha de boa temporada emprestado do Bahia. Artur, então, trocou o gigante Palmeiras, que o revelou, pelo projeto do Red Bull com brilho nos olhos ?os dois times, Palmeiras e Red Bull, jogam amanhã, pelo Campeonato Paulista, valendo vaga nas semifinais do Paulistão-2021.
“Fiquei muito feliz pelo projeto Red Bull confiar no meu trabalho. Quando eles mandaram a proposta, eu me amarrei muito. Nossos objetivos estão só no começo. Pensamos muito alto”, disse Artur em entrevista exclusiva ao UOL Esporte.
A adaptação do jogador ao clube foi rápida: no primeiro campeonato que disputou, o Paulistão de 2020, foi eleito o craque da competição. “Foi um início acima do que eu esperava. Foi tudo muito rápido pra mim. Me adaptei perfeitamente com todo mundo, os profissionais que trabalhavam e os atletas, e já fui ganhando de cara o craque, o gol mais bonito, seleção (do campeonato)”.
O que mais me surpreendeu foi o projeto que me foi dado. A empresa é internacional, a organização é fantástica pelos profissionais que estão aqui. É difícil uma pessoa recusar um projeto tão bom quanto o Red Bull Bragantino.”
13º grande
Convenciona-se dizer que o Brasil possui 12 clubes grandes: os quatro paulistas, os quatro cariocas, os dois de Minas Gerais e a dupla Gre-nal. Se depender do Red Bull Bragantino, esse número vai crescer muito em breve. Em seu primeiro ano na Série A, flertou com a zona do rebaixamento no primeiro turno, mas conseguiu mudar o cenário e se classificou com sobras para a Copa Sul-Americana. Para Artur, é apenas o primeiro passo.
“Sabemos do projeto, que é de jogadores novos e com muito talento. Sabemos do poder econômico que tem o Red Bull Bragantino, como eles pensam alto, pensam grande. Agarrei esse projeto e em menos de um ano conseguimos algo que não se conseguia há 25 anos (disputar a Sul-Americana). Acho que neste próximo ano já podemos sonhar alto, com Libertadores, até mesmo beliscar o Campeonato Brasileiro”, afirmou.
Para o atacante, a equipe de Bragança Paulista já se credenciou como o 13º grande do Brasil: “Podemos dizer que sim (hoje temos 13 grandes). Sonhamos alto, buscamos coisas grandes. É como sempre falamos, ‘Red Bull te dá asas’, então vamos voar o mais alto que a gente consegue.”
Estamos conseguindo nosso espaço no Brasil e no cenário internacional. Não precisamos jogar em um clube grande para aparecer, já estamos em um clube grande, em um projeto enorme e fantástico. Não sairia para outro clube do Brasil, só para a Europa. Estou muito feliz aqui, sou grato a todos, até à cidade, que é maravilhosa. Está tudo perfeito.”
Protagonismo dividido
Se Artur foi o protagonista no Paulistão de 2020 e levou o prêmio de craque do torneio, no Brasileirão foi outro atleta que brilhou e colecionou os troféus de craque, revelação e artilheiro da competição: o meia Claudinho. Mesmo sendo a contratação mais cara da história do clube e tendo impacto imediato na equipe, Artur não se importa em dividir o protagonismo.
“Tenho uma relação maravilhosa com o Claudinho. É uma ótima pessoa, um craque, sempre falo isso para ele. É uma parceria muito boa, ele me ajuda muito dentro e fora de campo. Tem outros bons jogadores como Raul, Léo Ortiz… Nosso grupo coletivo é maravilhoso. Fui melhor jogador do Paulista, mas não sozinho, foi com minha equipe inteira. E é a mesma coisa com o Claudinho no Brasileiro: o coletivo fez a individualidade dele aparecer muito bem e ganhou muito merecidamente o melhor jogador do Brasileirão”, disse.
Neste ano, os dois jovens de 23 (Artur) e 24 (Claudinho) anos seguem como as principais referências técnicas de um time que tem por filosofia exatamente isso: apostar em atletas de pouca idade e muito potencial.
Sem mágoa com o Palmeiras
Depois de se destacar no futsal do Uniclinic, Artur rumou para o campo e começou nas categorias de base do Ceará. O destaque no Vozão, no entanto, logo chamou atenção do Palmeiras e o atacante não teve dúvidas para aceitar a oferta do alviverde. Destaque também na base do Verdão, Artur acumulou convocações para as seleções de base e era visto como um jogador de futuro na Academia de Futebol.
Nunca, porém, teve de fato chances no profissional e acabou acumulando empréstimos. Em um deles, no Londrina, somou oito gols e dez assistências na Série B. Voltou e ganhou minutos, mas logo foi novamente emprestado, agora ao Bahia, em que explodiu de vez: dez gols e 11 assistências na elite do futebol brasileiro. Hoje, o Verdão conta com diversos jogadores da base como parte importante do time principal, mas a falta de chances a Artur não deixou mágoas no atacante.
“Nenhuma mágoa. Pelo contrário, tenho total gratidão ao Palmeiras. Cheguei com 14 anos e amadureci muito. Sou grato por tudo que aprendi, por ter subido cedo. Subi com 16 anos, não cheguei a jogar, mas me ajudou bastante a ter mais responsabilidade. O projeto da minha época era diferente pelo fato de ter muitos jogadores de nome, contratações de expressão. Entendo perfeitamente que não era meu momento. Segui trabalhando até conquistar meu espaço no cenário nacional”.
Fui emprestado e dei um retorno financeiro ao Palmeiras e acho que eles são gratos por esse lucro.”
Quatro ônibus
Artur nasceu no Ceará, mas se mudou muito jovem para o Piauí, onde jogava bola na rua até os 12 anos. Com essa idade, Artur voltou para Fortaleza e começou a treinar no futsal do Uniclinic. A rotina não era fácil. Estudava de manhã e treinava às 16h, mas ia direto da escola para o treino por causa da distância: o garoto precisava pegar quatro ônibus para treinar. Diversas foram as vezes em que chegava em casa às 20h sem sequer ter almoçado.
“Era difícil pelo fato de onde eu morava em Fortaleza tinha que pegar uns quatro ônibus para chegar até lá (Uniclinic). Era isso. Às vezes nem conseguia me alimentar direito. Meu pai viu que não estava dando jogo. Ele via que eu queria muito, por todo esforço que estava fazendo com 12 anos, via meu sacrifício para chegar. Ele correu atrás para conseguir algo melhor, que era o Ceará ou o Fortaleza”, contou.
A solução foi uma peneira descoberta pelo pai para a base do Ceará. O teste tinha três etapas, mas bastou um treino para o baixinho ser aprovado. Com a camisa do Vozão, o atacante se destacou aos 14 anos em uma competição no Rio de Janeiro. O Ceará até tentou manter o atleta, mas…
O Bruno Petri, que era do Palmeiras, pediu contato do meu responsável e passei o telefone do meu pai. O Ceará não queria deixar, queria que eu permanecesse, mas não tinha contrato nem nada, então… Palmeiras, né? Não tinha como não ir.”
Fonte: UOL