Nesta quinta-feira, o Shakhtar Donetsk recebe o Eintrach Frankfurt, às 18h (de Brasília), pelos 32-avos de final da Liga Europa.

E uma das esperanças do time ucraniano para fazer um bom resultado em casa é o atacante brasileiro Fernando dos Santos Pedro, que vem ganhando cada vez mais espaço na equipe comandada pelo português Paulo Fonseca.

Ele chegou à equipe laranja e preta em julho do ano passado, quando foi comprado do Palmeiras por 5,5 milhões de euros (à época, R$ 24 milhões), mesmo tendo feito apenas duas partidas pela equipe profissional do Alviverde.

Desde que chegou, soma 15 partidas, com dois gols marcados e uma assistência. Ele vem ganhando rodagem e chegou até mesmo a enfrentar o poderoso Manchester City pela atual edição da Champions League.

Com apenas 19 anos e um futuro muito promissor pela frente, Fernando teve uma ascensão meteórica no futebol, indo em poucos anos de vendedor de porta estádio ao estrelato na Europa.

TROPEIRÃO DO MINEIRÃO

Nascido em Belo Horizonte, Fernando sempre foi trabalhador desde muito jovem.

– Quando eu tinha 12 anos, meu pai tinha um carrinho de lanche e eu sempre quis trabalhar com ele. Antes, ele não deixava, porque eu era muito pequeno. Depois, quando fiz 14 anos, ele começou pouco a pouco a me deixar ajudar – lembrou, em entrevista à ESPN.

– Ficávamos sempre na porta do Mineirão e no Parque Municipal de Belo Horizonte. Primeiro eu ia mais no parque, porque era menos ‘muvuca’, mas depois passei a ir para o Mineirão também. Virou minha rotina: todo dia de jogo eu ajudava meu pai – contou.

Ao mesmo tempo em que dava uma força à família, ele dava seus primeiros chutes na bola.

– Minha mãe e meus dois irmãos trabalhavam também. Eu ganhava meu dinheiro, mas minha mãe não pedia nada para mim. Fiquei uns três anos nessa rotina com meu pai. Jogava de sábado e trabalhava de domingo vendendo o famoso tropeirão – rememorou o garoto, que foi aprendendo os traquejos do mundo do comércio aos poucos.

– No começo eu tinha um pouco de vergonha dos clientes, era tímido para vender. As pessoas me viam e eu saía correndo (risos). Ficava com medo de me zoarem. Mas, com o passar do tempo, me acostumei e ficou cada vez mais bacana. Eu achava que iam tirar uma com a minha cara, mas sempre foi o contrário – brincou.

O pai de Fernando, inclusive, trabalha até hoje como vendedor.

– Quando fui para o Palmeiras, parei de vender o tropeiro porque mudei para São Paulo. Mas meu pai vende lá até hoje, porque desde pequeno faz isso. Ele adora e não quer largar! Hoje é a esposa do meu pai que cozinha, e eles trabalham juntos – relatou.

CHEGADA AO PALESTRA ITÁLIA

Fernando começou no futebol pelo Democrata de Sete Lagoas, cidade a 60 km de Belo Horizonte. No começo de 2016, porém, o projeto acabou, e ele acabou indo para a AMDH (Associação Mineira de Desenvolvimento Humano), pela qual teve chance de disputar a Taça BH sub-17.

Sua equipe foi eliminada ainda na primeira fase, mas o garoto se destacou muito e despertou a cobiça de grandes clubes.

– Faltando um mês para começar a Taça BH, tive uma tendinite. Fui a um médico, que disse que eu ficaria três meses parado. Depois, fui a um outro especialista que recomendou ficar um mês parado. Desanimei e achei que não ia dar para jogar. Mas passar uma semana me tratando e voltei antes do tempo. Nos primeiros dias foi difícil, mas depois peguei ritmo de jogo – lembrou.

– Contra o Figueirense, fui abaixo, porque estava voltando a jogar. No segundo jogo, contra o Atlético-MG, já foi muito bom, fiz um gol e empatamos. Na última partida, contra o Paraná, também fui bem e fiz outro gol – relatou.

Após a eliminação da AMDH, vieram duas propostas oficiais: uma do São Paulo e outra do Athletico Paranaense. Como contou a ESPN em 2017, porém, o Palmeiras partiu com tudo para cima e conseguiu fechar com a joia.

– Eu estava indeciso entre as duas propostas que tinham chegado até mim, mas na sexta-feira o Palmeiras veio com uma oferta de três anos de contrato e um salário que me ajudaria bastante. Na hora, eu e meu pai decidimos assinar – revelou.

A mudança para o Palestra Itália, porém, não foi das mais tranquilas para um garoto tão apegado à família.

– Eu nunca tinha saído de casa na vida. O início foi muito difícil para mim. Estava longe dos meus familiares e todo dia pensava em ir embora. Minha mãe brinca até hoje: ‘Ainda bem que você não tinha dinheiro pra voltar pra casa, senão tinha ido embora’ (risos). Pior que é verdade, porque eu não estava dando conta da vida nova em São Paulo e da rotina – lembrou.

– Só que aí fiz dois jogos pelo sub-17 e já me subiram para o sub-20. Foi aí que as coisas começaram a acontecer pra mim. Joguei a Copa RS sub-20 e a Copa São Paulo de Futebol Júnior. Era um teste para ver como eu me sairia, e deu tudo certo. Na teoria, não era para eu ser titular, porque eu era moleque ainda, e havia garotos mais velhos. Mesmo assim, fui titular, fiz gols e me destaquei. Nem acreditava no que estava acontecendo. Um ano antes, eu estava vendo aquelas competições pela TV. Nem acreditava naquilo – suspirou.

A chegada do técnico Wesley Carvalho, que hoje faz muito sucesso no sub-20 do Verdão, fez Fernando crescer ainda mais, fazendo um excelente Paulista sub-20 em 2017. Não à toa, no mesmo ano ele já foi puxado para o profissional alviverde.

– Fiz minha primeira partida pela equipe adulta contra o Vitória, no Brasileirão de 2017, com o Alberto Valentim. Me ligaram no alojamento da base avisando que eu ia viajar com o profissional para Salvador. Na hora, tomei um susto, nem acreditava (risos). Só depois que a ficha caiu – sorriu.

– A gente estava perdendo o jogo e achei que eu não ia entrar. No intervalo, porém, o Alberto me mandou aquecer e minhas pernas até bambearam (risos). Fiquei muito feliz. Infelizmente, nós perdemos, mas foi muito especial. As coisas aconteceram muito rápido para mim. Nunca esperei que fosse assim – exaltou.

No final de 2017, o atacante renovou até 2022 com o Palmeiras e jogou mais uma boa Copa RS. Em seguida, arrebentou na Copa São Paulo de 2018 e foi promovido definitivamente ao profissional no Campeonato Paulista daquele ano.

– Eu era integrado para todos os jogos, e joguei contra o Ituano, pela última rodada da primeira fase. Pensei comigo: ‘É agora!’. Entrei na vaga do Papagaio e em cinco minutos recebi um cruzamento da esquerda e fiz meu primeiro gol no profissional. Eu até deitei no chão na hora, nem acreditei naquele sonho. Chorei pra caramba, não acreditava – emocionou-se.

– O Dudu, o Scarpa e o Thiago Santos me abraçaram e falaram: ‘Curte o momento, moleque’. Só a partir dali eu comecei a acreditar que tudo aquilo que estava acontecendo era realidade. A torcida até gritava: ‘ão, ão, ão, Fernando é seleção’ (risos) – gargalhou.

– Tenho muito carinho pelo Palmeiras, que foi o time que abriu as portas para minha carreira – completou.

A VENDA AO SHAKHTAR

Com todo aquele sucesso repentino, Fernando de cara foi apelidado pela imprensa europeia de “novo Gabriel Jesus”. E, como á hábito no futebol brasileiro, logo os clubes europeus passaram a bater na porta do Palmeiras para levar o jovem atacante.

– Eu já sabia desde a Copa RS que havia times de fora querendo me comprar, mas achei que o Palmeiras não fosse me vender. Lembro até que falei para minha mãe que era cedo para sair, não queria, pois eu era muito novo. Para falar a verdade, nem sabia do interesse do Shakhtar – recordou.

– No meio do Brasileirão, quando voltamos de um jogo contra o Ceará, ia ter a pausa para a Copa do Mundo. Eu estava no alojamento arrumando minhas coisas e feliz que eu ia para casa, pois fazia muito tempo que não via minha família. De repente, meus empresários me ligaram dizendo que o Shakhtar havia feito a proposta, e faltava só a resposta do Alexandre Mattos – revelou.

– Na hora, eu tomei um susto. No dia seguinte, meus empresários disseram que eu fui vendido e já ia embora para a Ucrânia na quinta-feira, e que na segunda precisava me apresentar ao clube. Pensei: ‘Como assim? Nem me despedi da minha família!’ (risos). Foi a primeira coisa que passou pela minha cabeça. Foi muito rápido. Eu soube na terça do interesse e na quinta já estava no avião indo assinar o contrato – contou.

Os parentes foram logo depois para ajudar Fernando a se adaptar.

– Meu irmão é casado e tem a vida dele, então não podia ir comigo. Pedi então a um primo meu, com quem tenho uma relação de irmão: ‘Se um dia eu for para fora do Brasil, você mora comigo?’. Ele topou! Quando fui vendido ao Shakhtar, foi a primeira pessoa que pensei. Ele aceitou mesmo e hoje mora aqui comigo e com a minha mãe – afirmou.

A enorme entourage brasileira do Shakhtar (que por conta da tensão política com a Rússia hoje é sediado e manda suas partidas em Kiev, e não mais em Donetsk) também rapidamente abraçou Fernando.

– Todos me ajudaram muito na adaptação. O cara com quem peguei mais amizade é o Dentinho, que é um irmão para mim. Estamos sempre juntos. Cheguei junto com o Maycon, ex-volante do Corinthians, e também ficamos próximos. Achei que seria mais complicado, muita gente disse que eu ia querer voltar rápido para o Brasil, mas tudo foi muito diferente do que eu imaginava. Além disso, nosso técnico é português, o que deixou as coisas mais fáceis – comemorou.

Seu momento de maior brilho aconteceu na Liga dos Campeões, quando ele enfrentou nada menos que o poderoso Manchester City de Josep Guardiola.

– Nem acreditei que jogaria a Champions. Quando vi meu nome na relação dos convocados, foi algo incrível. Eu estava bem no Campeonato Ucraniano, entrei no primeiro jogo contra o Hoffenheim e fiquei tranquilo. Antes do jogo contra o City, o treinador me deu o colete de titular no treino e eu achei que ele estava brincando (risos) – divertiu-se.

– Foi legal porque tive a oportunidade de enfrentar um cara de quem eu era muito fã desde a base do Palmeiras: o Gabriel Jesus. Antes da partida, pedi ao meu empresário para tentar trocar camisa com ele. No fim, nós perdemos e ele mesmo veio falar comigo: ‘Espera que vou te dar uma camisa’. Eu pensava que um ano e meio antes eu estava vendo ele começar a brilhar e agora estava enfrentando o cara na Champions! Foi uma correria e conversamos pouco, mas peguei a camisa no vestiário e guardo com carinho – contou.

Recentemente, Fernando teve uma lesão e acabou ficando três meses parado, mas já está de volta aos gramados e pronto para jogar nesta quinta-feira, contra o Eintracht Frankfurt.

Como é de hábito, ele sonha alto para o restante da carreira.

– Quero ganhar muitos títulos aqui no Shakhtar e ter uma caminhada depois igual à do Willian, do Douglas Costa e de outros brasileiros que aprenderam muito aqui e viraram jogadores top – finalizou.

Fonte: Site da ESPN